Entre tempos e carcaças

Mika Takahashi, Epílogo V, 2022.

Cavalo convida Piscina
Entre tempos e carcaças

À convite da Cavalo, a Piscina – plataforma que desde 2015 atua na pesquisa e divulgação do trabalho de mulheres artistas, apresenta Entre Tempos e Carcaças, sua primeira exposição em uma galeria, reunindo trabalhos de Arorá, Anália Moraes, Darks Miranda e Mika Takahashi. A mostra ocupa uma das salas do andar superior do Espaço CAMA, e abre ao público no dia 24 de setembro e segue em exibição até 31 de outubro.  Veja vistas da exposição aqui.

A reflexão que conduz a mostra se iniciou a partir de pinturas da série Epílogo, de Mika Takahashi. Estas, por sua vez, têm como ponto de partida o fenômeno natural conhecido como "whale falls", que ocorre quando uma carcaça de baleia atinge as profundezas do oceano, dando lugar a ecossistemas que podem sobreviver dos nutrientes de sua decomposição por décadas.

Pensar sobre esse fenômeno natural desencadeou reflexões sobre vestígios, processos de decomposição, bem como a finitude da matéria que dá lugar à vida, que se transforma e se regenera. Assim, a exposição propõe uma reflexão sobre a passagem do tempo, sobre arqueologias, morfologias, espaços e estados híbridos.

Arorá, Quedas d’água, 2022.

A decomposição é, por excelência, o lugar do "entre": entre a vida e a morte, entre as transformações de estado da matéria, entre passado e futuro. O trabalho de Arorá (2000, Rio de Janeiro), de certo modo, habita este espaço a partir da formatação do que a artista chama de "híbrido espacial". As obras que integram a série "Suspenses", por exemplo, são compostas de três partes: a estrutura – o ferro, retirado de escavações da artista em seu próprio quintal –, o caminho, que é a linha; e o corpo, que é a pérola. Esta última, por sua vez, transita de um lado para o outro, entre dicotomias. "Não faço uma arquivologia formal, mas é uma arqueologia artística do meu quintal – e eu faço essas instalações que são modos de estudar a presença do corpo do espaço e de como formatar o híbrido, uma das minhas maiores motivações", revela a artista.

Nas pinturas de Mika Takahashi (São Paulo, 1988) sobrepõem-se memórias, vivências e imagens, utilizadas pela artista para criar outros universos. "Acho que a memória também funciona um pouco assim, vai sobrepondo experiências para construir outra. Quando lembramos de coisas do passado, lembramos de uma forma diferente que outra pessoa lembrou, mesmo vivenciando a mesma coisa." Na série Epílogo, Takahashi parte das imagens de carcaças de baleias e constrói um ambiente ambíguo e onírico, que transita entre abstração e figuração.  

Anália Moraes, Tensões de Fusão, 2022.

Os diferentes e variados ecossistemas que se formam a partir da morte de uma baleia tensionam a ideia de fim, tendo em vista que a finitude sempre se transforma em vida. Anália Moraes (São Paulo, 1994) busca, em sua pesquisa, observar os sistemas da natureza e expandi-los para uma escala familiar, que se aproxima do seu objeto de estudo, a cerâmica. Suas esculturas remetem à estruturas celulares e processos naturais, como se estes tivessem sido congelados, quase como fósseis, restos de seres vivos que evidenciam atividades biológicas de outros tempos. 

A sobreposição de matérias e temporalidades também está presente na obra de Darks Miranda, que se define como uma "entidade pastelão que brota dos escombros mudos da modernidade e desliza pelas camadas de lodo acumuladas no concreto através dos tempos". Em seus trabalhos, a artista faz uso de materiais sintéticos como isopor queimado, látex pré vulcanizado, silicone, plástico, resina e tinta spray para criar formas que exploram a dicotomia entre o natural e o artificial, remetendo a peles, carcaças e seres de outros tempos.

Em Ancestral do Futuro (2022), por exemplo, a artista apresenta uma bandeira confeccionada em látex cujo título se baseia na frase “Considere que você é uma ancestral do futuro”, da escritora, bruxa e ecofeminista estadunidense Starhawk. Através da obra, a artista convida a refletir sobre como o impacto e a sobreposição de nossas ações no presente irão definir como vivenciamos o amanhã.

Darks Miranda, Ancestral do futuro, 2022.

Serviço
Entre Carcaças  uma curadoria Piscina para a galeria Cavalo
Abertura: 24 de setembro, 11h às 18h
Exposição até 31 de outubro
Espaço C.A.M.A
Alameda Lorena, 1257 - casa 4 - Jardim Paulista, São Paulo